Geólogos ouvidos pelo Estadão avaliam que a área da BR-376, em Guaratuba, no Paraná, onde ocorreu o deslizamento de terra na segunda-feira, 28, que matou pelo menos duas pessoas, era considerada de risco e favorável à ocorrência de eventos deste tipo. Eles divergem da Arteris Litoral Sul, concessionária responsável pelo trecho, que afirmou que o local “é monitorado periodicamente” e “não apresentava risco”.

Os geólogos indicaram ainda que a área apresenta mais riscos com a continuidade da chuva na região, o que interfere no trabalho das equipes de resgate. Eles explicaram que também há blocos de rocha em meio à lama. As informações levantadas pelo Cenacid, da UFPR, foram repassadas para auxiliar na segurança do trabalho de busca e remoção.

Os trabalhos de busca de vítimas, com ajuda de cães, e remoção da lama na BR-376 estão no quarto dia nesta sexta-feira, 2. O governo do Paraná reduziu a estimativa de vítimas para pelo menos 14 pessoas. Inicialmente, a previsão era de 30. Além de duas mortes, seis pessoas foram resgatadas no local. Seis veículos pesados e três leves também foram removidos.

Foto: CBMSC/Divulgação da Matéria

Para Abdel Hach, geólogo e integrante do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paraná (Crea-PR), o trânsito deveria ter sido fechado totalmente após um primeiro deslizamento, por volta das 15h30 da segunda, cerca de quatro horas antes da tragédia. “É uma área conhecida pelos geólogos, área de risco. Tinha que fechar para evitar o pior, era a solução no momento. Danos econômicos se recupera, danos fatais são irreversíveis. Não foi um fato isolado, existem cicatrizes de problemas anteriores”, disse.

De acordo com o geólogo, estudos técnicos feitos por ele em 2017 na região onde aconteceu os deslizamentos já indicavam pontos de vulnerabilidade, sendo alguns de alto risco. Ele explicou que na segunda aconteceu no local um movimento de massa chamado corrida de lama, que poderia ter sido previsto com base em monitoramento e análises.

“Acontece com altíssima velocidade. A tensão da água misturada com a tensão da argila levanta o que tiver pela frente”, indicou “Queda de blocos, rastejo e corrida de lama são deflagrados com água, mas a água não é a culpada. Ela deflagra (eventos como esse) quando há um cenário para isso acontecer”, explicou.

E não faltou chuva na região. Apenas na segunda, o volume de chuva acumulado no ponto de medição mais próximo do local do deslizamento foi de 247 mm, que está acima da média mensal, conforme o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). Segundo o órgão, há alerta de risco para a região desde o domingo, 27.

O geólogo Renato Eugênio de Lima, diretor do Centro de Apoio Científico em Desastres (Cenacid), da Universidade Federal do Paraná (UFPR), visitou o local do deslizamento na terça-feira, 29, e na quarta-feira, 30. “Ali foram três deslizamentos principais: o que atinge a rodovia, um que está logo acima dele e um que está do outro lado do vale. Formam um sistema complexo de deslizamentos”, explicou. “Esse tipo de processo não oferece chance para as pessoas, são segundos”, afirmou.

Ele se mostrou cauteloso ao ser questionado sobre a decisão de fechar ou não o tráfego na rodovia nas condições que estavam na segunda-feira, mas afirmou que a região apresentava riscos e merecia cuidados especiais. “Depende da magnitude dos movimentos e dos padrões que eles (concessionária) têm para a operação da via. Não conheço o sistema deles e também não sei quais informações tinham no momento para a decisão. Mas devem existir padrões que quando alcançados vão progressivamente estabelecendo medidas”, disse.

Na terça, a Defesa Civil informou que a concessionária sabia do risco de deslizamentos na BR-376 com o acumulado de chuva. Para a Polícia Rodoviária Federal (PRF), caberia à Arteris Litoral Sul a decisão sobre a interdição total do trecho, que estava com bloqueio parcial. Em nota, a concessionária afirmou que a prioridade é o atendimento às vítimas e liberação da pista.

“A Arteris ressalta que possui um programa permanente de monitoramento de encostas e que o trecho em que aconteceu o deslizamento é acompanhado periodicamente, sendo parte de suas obrigações contratuais. Neste momento, qualquer afirmação sobre as causas do deslizamento seria prematura, pois não contaria com o embasamento técnico necessário”, informou.

A reportagem entrou em contato com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), responsável por fiscalizar a prestação de serviços das concessionárias, e aguarda retorno.

Fonte: Estadão Conteúdo/Cidadeverde.com

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